Os Ombros Suportam o Mundo
Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teu ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação
Análise geral
§
1ª estrofe: Aborda a questão da
ausência de amor entre as pessoas em sociedade, o individualismo, a frieza dos
sentimentos e das emoções com relação ao próximo, como é retratado no verso: “E
os olhos não choram” (se não há sentimento não há choro).
§
2ª estrofe: É possível analisar
que a sociedade não tem deixado “brechas” para que haja solidariedade até mesmo
pelos mais íntimos. Por isso, os indivíduos como um todo estão cada vez mais
solitários, mas mesmo diante dessa situação existe “uma luz no fim do túnel”.
§
3ª estrofe: Nota-se a questão de
que as pessoas já estão tão sozinhas que a própria morte ou a velhice não
incomoda mais a ninguém, ou melhor, a velhice e a morte seriam mais o menos
como uma forma de se livrar dessa solidão.
§
De uma forma geral, pode-se perceber a presença de questões sociais no
poema, em que nota-se principalmente as temáticas da solidão, de sentimentos,
ou melhor, da falta deles, do sofrimento, que apesar de não ser temas ou
problemas sociais, falando-se ao pé da letra, acaba se tornando no poema de
Carlos Drummond, já que envolve o fato dos relacionamentos entre as pessoas num
meio social, a falta de solidariedade, que vai trazer outros temas relacionados
como a morte, a velhice e a própria
esperança.
Elegia 1938
Trabalhas
sem alegria para um mundo caduco,
onde as formas e as ações no encerram nenhum exemplo.
Praticas laboriosamente os gestos universais,
sentes calor e frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual.
Heróis enchem os parques da cidade em que te arrastas,
e preconizam a virtude, a renúncia, o sangue-frio, a concepção.
À noite, se neblina, abrem guarda-chuvas de bronze
ou se recolhem aos volumes de sinistras bibliotecas.
Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra
e sabes que, dormindo, os problemas de dispensam de morrer.
Mas o terrível despertar prova a existência da Grande Máquina
e te repõe, pequenino, em face de indecifráveis palmeiras.
Caminhas entre mortos e com eles conversas
sobre coisas do tempo futuro e negócios do espírito.
A literatura estragou tuas melhores horas de amor.
Ao telefone perdeste muito, muitíssimo tempo de semear.
Coração orgulhoso, tens pressa de confessar tua derrota
e adiar para outro século a felicidade coletiva.
Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição
porque não podes, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan.
Análise geral
1ª
estrofe: No verso “trabalhas sem alegria para um mundo
caduco” aborda a questão de que o homem é “forçado” a trabalhar para um “mundo
caduco”, isto é, um mundo capitalista, o homem trabalha para sobreviver.
Apresenta também que o mundo não serve de exemplo, muito pelo contrário, só exclui,
generaliza e ataca o homem e ainda mostra através do último verso as
necessidades humanas que nem sempre podem ser supridas.
3ª
estrofe: Retrata a ideia de noite como o sono, o esquecimento
temporário dos problemas, e também do amanhecer que revela a explosão
capitalista que “maquinifica” o homem que se torna insignificante diante dos poderosos.
4ª
estrofe: Representa inicialmente os trabalhadores como
mortos-vivos, criticando o trabalho árduo e exagerado na sociedade. E também
retrata a ideia do sonho relacionada à literatura, os romances românticos que
levam à idealização. E ainda é citado o telefone como forma menos humana de
interação, ou seja, o distanciamento das pessoas no meio social, a ideia do
próximo que não existe mais.
5ª
estrofe: Entra a questão de que um dia tudo mudará, e também
a ideia do capitalismo ao citar a Ilha de Manhattan, em que o socialismo não
pode combater o capitalismo.
O poema acima aborda, de uma maneira generalizada,
a questão do exagerado trabalho, ou melhor, do trabalho árduo em troca de
pequenos ganhos. A ideia do capitalismo como um ponto negativo para a sociedade
já que traria principalmente a desigualdade social. Também é retratado as
lutas, a guerra, a violência em geral e que há uma esperança de mudança em o
principal refúgio é a noite já que o dia representa a volta ao trabalho. E
ainda a influência da literatura com um meio de pensar e sonhar numa sociedade
melhor.
A flor e a náusea
Preso à minha classe e a algumas
roupas,
Vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjoo?
Posso, sem armas, revoltar-me'?
Vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjoo?
Posso, sem armas, revoltar-me'?
Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
Fundem-se no mesmo impasse.
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
Fundem-se no mesmo impasse.
Em vão me tento explicar, os muros são
surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.
Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.
Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.
Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem
Suas pétalas não se abrem
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.
Sento-me no chão da capital do país às
cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
Análise geral
1ª estrofe: Apresenta a questão do materialismo e
até mesmo da falta de valores morais por conta do próprio materialismo. A falta
de humanidade que está ligada a necessidade de uma atitude em relação aos
problemas sociais de uma forma generalizada. No verso “Posso sem armas,
revoltar-me?” nota-se a temática violência, a guerra. Pois para que haja uma
disputa nem sempre é preciso a utilização de armas que no contexto representa a
morte.
2ª estrofe: Percebe-se a presença da
metalinguagem ao falar-se a respeito dos poemas e também dos poetas. E há uma
crítica à sociedade, já que a partir da sociedade e das problemáticas que nela
existem os poemas são elaborados, e já que se trata de um tempo pobre, os
poemas serão pobres, isto é, se o meio social é “pobre”, a poesia também será.
4ª estrofe: Nota-se a influência da cidade e mais
uma vez a questão do materialismo. E também a libertação do tédio é abordado
através do verso “Vomitar esse tédio sobre a cidade”, já que o vômito
representa um desabafo ou um alívio em relação à algo.
5ª estrofe: Os primeiros versos da quinta estrofe
aborda a presença dos crimes. Até mesmo os crimes que são considerados pontos
negativos na sociedade se torna um ponto positivo na poesia, e esses crimes diz
respeito aos erros das pessoas em geral.
7ª estrofe: Diz respeito ao nascimento da flor, que
pode significar a esperança, que embora pequena e improvável ela existe, e isso
é um grande motivo para assustar as pessoas, o meio social.
8ª estrofe: O verso “É feia. Mas é realmente uma
flor” remete a questão da flor como mínima porém existente, difícil de existir
mas não impossível.
O poema “A flor e a náusea”
está voltado para a ideia de uma esperança em um meio com determinados
problemas relacionados às próprias questões sociais. Então, de uma forma geral,
é perceptível a abordagem acerca da temática social em que ao longo do poema
faz-se necessário diante de uma sociedade problemática uma mínima esperança, e
por se tratar de um meio social com problemas a ideia de esperança se torna
difícil e então por isso o espanto ao se tratar de uma flor que embora feia
exista. E a ideia do feio relaciona-se justamente ao imperfeito, ou seja, não é
a esperança a qual todos esperavam e necessitavam, mas é esperança.
Equipe:
João Gabriel, Camila Soares, Layanne, Helaine, Raylla e Wédna.(
2º Branco)